Água na Terra mais antiga do que o Sol aumenta probabilidade de vida noutros sistemas estelares

06-01-2015 09:57

Proporção de água pesada no sistema solar mostra que parte importante deste líquido provém da grande nuvem molecular onde o nosso Sol surgiu.

O sistema solar nasceu do colapso do gás de uma pequena porção de uma grande nuvem molecular, que alimentou o novo sistema com partículas de gelo Bill Saxton/NSF/AUI/NRA

 

A água está em toda a parte no sistema solar, “nos gelos dos cometas, nos oceanos terrestres, nas luas geladas dos planetas gigantes, nas bacias à sombra de Mercúrio”, lê-se num artigo publicado quinta-feira na revista Science. Na Terra, a água foi fundamental para a vida, que surgiu num ambiente aquático. O testemunho dessa importância continua marcado em nós: somos 65% água. Por isso, conhecer a origem deste líquido pode ajudar a estimar a probabilidade de identificarmos vida nos outros sistemas estelares.

A equipa de Tim Harries, da Universidade de Exeter, no Reino Unido, foi atrás dessa origem e descobriu, segundo os seus cálculos, que parte importante da água no sistema solar veio de pedacinhos de gelo da grande nuvem molecular onde o sistema solar surgiu, como mostra o artigo intitulado A antiga herança de água gelada no sistema solar. Os autores concluem que, se estrelas como o Sol forem frequentes, então é possível inferir que o universo está povoado de sistemas onde a água é ubíqua, aumentando a probabilidade de haver vida.

“Há uma questão antiga sobre se alguns destes antigos gelos (…) são incorporados nos jovens sistemas planetários, ou se os tijolos pré-planetários são todos reprocessados e sintetizados localmente perto da estrela [em formação]”, disse Ilsedore Cleeves, da Universidade de Michigan, EUA, e um dos autores do artigo.

“Estes dois cenários têm consequências muito diferentes na composição dos planetas”, acrescentou o investigador, citado num comunicado da Universidade de Exeter. “Se for o último cenário a acontecer, a composição química dos planetas, incluindo a sua água, seria dependente do tipo de estrela onde o planeta surge. O cenário oposto sugere que todos os sistemas planetários teriam sido formados a partir de um conjunto semelhante de materiais, incluindo água interestelar.”

Para avaliar quais destes dois cenários encaixa na situação actual do sistema solar, os investigadores foram à procura de água pesada nos oceanos da Terra, mas também em amostras de meteoritos e nos cometas.

O hidrogénio é o átomo mais simples de todos. Na Terra, mais de 99,8% dos átomos de hidrogénio são formados por um protão e um electrão. Mas há dois outros isótopos estáveis de hidrogénio muito mais raros: o deutério, que tem um protão, um neutrão e um electrão; e o trítio, que é naturalmente raríssimo, e tem um protão, dois neutrões e um electrão. A água pesada é composta por deutério em vez do tipo de hidrogénio mais comum.

Segundo os cientistas, no espaço interstelar, as temperaturas mais frias e os raios cósmicos fazem com que se produza mais deutério do que no ambiente mais quente que reinava aquando da formação do nosso sistema solar. Por isso, se houver água na Terra proveniente do meio interestelar, a proporção de deutério hoje será maior do que se toda a água tivesse sido formada de novo, durante o nascimento do sistema solar, há mais de 4,5 mil milhões de anos.

A análise feita pelos cientistas da proporção de deutério em relação aos modelos que criaram para estes dois cenários mostrou que os oceanos poderão ter entre 7% e 50% de água vinda do meio interestelar. “Ao identificar a antiga herança da água da Terra, podemos ver que a forma como o nosso sistema solar se formou não será a única, e que os exoplanetas irão formar-se [num ambiente] com muita água”, explicou por sua vez Tim Harries. “Consequentemente, isto aumenta a possibilidade de que alguns exoplanetas possam ter as condições certas, e os recursos de água, para a vida evoluir.”

 

Fonte: Público